segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Réplica da boate Kiss é construída e erros são apontados por engenheiro



Após a morte de 237 pessoas em um incêndio na boate Kiss em Santa Maria no último domingo (27), muitas respostas e dúvidas ainda não foram solucionadas sobre o que aconteceu dentro do estabelecimento. O Fantástico construiu uma réplica fiel da casa noturna, com base nas informações das plantas do imóvel e teve ajuda do engenheiro Moacyr Duarte, especialista em gerenciamento de riscos e planejamento de emergências, e levou em consideração o relato de pessoas que estiveram na boate naquela noite - Luciene e Marcelo que conseguiram escapar do incêndio e Vanessa Vasconcellos, que foi relações públicas da casa por dois anos e conhece detalhes da infraestrutura.
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A planta mais recente da boate Kiss que consta na prefeitura de Santa Maria é de 2009, mas sofreu alterações, como outra de 2011, que modificou a área da pista principal. Para ter total realidade, a dimensão do tamanho da casa foi “transportada” para a réplica: 23 metros de fachada por 26 de profundidade.
Capacidade
Segundo os bombeiros, a boate Kiss tinha capacidade para 691 pessoas e o engenheiro explica como é feito este cálculo. “Descontando todo o espaço do interior da casa que não é ocupado pelo público. Ou seja, deixando só a área em que o público realmente fica. Quando você tiver a área restante, isso é para público em pé, dividido por 0,4 metros quadrados. Aí você acha o número de pessoas da casa”, responde Moacyr. Segundo os cálculos de Moacyr, 0,4 metros quadrados é o espaço necessário para que uma pessoa de 70 quilos fique em pé sem que ninguém encoste.
Vanessa diz que, quando era responsável pela impressão das comandas, era praxe fazer mil comandas por festa. Além dessas mil, segundo ela, de 200 a 500 comandas eram guardadas para o caso de haver mais pessoas. Ela contou que era dito que a capacidade da boate era de 1,2 mil pessoas. Luciene testemunha que tinham pelo menos mil pessoas lá no dia.
Com base no relato das pessoas, uma simulação foi realizada com a lotação com as 691 pessoas permitidas; já com mil pessoas, a boate estaria praticamente sem espaços vazios.
Entrada
À direita era a bilheteria da casa, onde as pessoas pegavam a comanda, passavam por uma grade e entravam na boate através de uma porta, por onde bombeiros tentavam e algumas pessoas que já tinham conseguido sair da boate tentavam resgatar quem ficou pra trás.
Passando pela porta, há outra grade, que inutiliza as aberturas da porta, pois reduz o espaço disponível para a passagem das pessoas e fica a uma largura que não é suficiente para que duas pessoas passem ao mesmo tempo.“Isso sem dúvida foi responsável por um grande retardamento da saída”, ressaltou Moacyr Duarte.
Palco
Para chegar até o lugar do show, há duas grades, um vão e um degrau. Uma parte da pista é rebaixada em relação ao resto da casa. Vanessa fala que até novembro eram três degraus, e os donos da boate resolveram elevar o piso por questões estéticas. Vanessa conta também que o dono da boate contou que foram gastos R$ 60 a R$ 70 mil na reforma.
No depoimento à polícia o vocalista da banda, Marcelo Santos, disse que entre seu braço e o teto havia uma distância de no mínimo dois metros. Vanessa diz que não, que se o vocalista tem 1,80m, com o braço levantado, teria mais um metro até o teto, no máximo. A área sobre o palco era revestida de espuma feita de material tóxico.
Na hora do incêndio, Marcelo Carvalho estava num mezanino, de frente para o palco. “Eu vi um pequeno fogo na frente do palco e um cara tentando apagar. As pessoas estavam correndo, mas eu fiquei parado. Pensei que o fogo seria controlado. Quando me virei de costas para sair, veio a fumaça”, lembrou Marcelo.
Na reconstituição, o engenheiro afirma que a fumaça que começa no teto é diferente da que começa no chão. “Quando o fogo começa no chão, a fumaça se espalha pelo teto e dá a oportunidade que as pessoas se moçam rente ao assoalho. Quando o fogo começa no teto, a fumaça faz um grande colchão quente, até encontrar as paredes laterais. Onde ela desce e envolve o ambiente. Isso elimina a conduta segura de se movimentar rente ao chão”, relatou Moacyr.
Sobre possíveis soluções para ser feitas no momento do incêndio, Moacyr dá sua opinião. “O artefato pirotécnico é de poucos segundos. Se houvesse uma cobertura na espuma, com compensado tratado ou outro material resistente, não teria sido suficiente aquela fonte técnica para iniciar o fogo e nada disso teria acontecido”, disse. “A fumaça no teto se espalha como se o teto fosse uma piscina invertida. Ela vai descendo. Quando encontra as paredes, ela esquenta a superfície”, explica o professor.
Marcelo conta que o ar-condicionado soprava a fumaça depois do fogo. Segundo ele, um duto de ar entre o palco e a pista empurrou a fumaça para a frente da Kiss. Moacyr explica que o ar, provavelmente, tinha um disjuntor separado. Quando a luz caiu, o ar continuou a funcionar, sendo, provavelmente, uma das últimas coisas a ser desligadas. “As normas técnicas não falam nada sobre drenagem de fumaça. Eu acho que a partir desse evento, isso deveria ser considerado como um dos elementos de orientação para as casas noturnas”, afirmou Moacyr.
Banheiros
Os banheiros tinham janelas para a rua, que foram cobertas pelo revestimento de madeira da fachada. Quando pessoas desesperadas tentaram marretar a fachada para o resgate, essas janelas ficaram visíveis. Uma sobrevivente conta que muita gente foi parar no banheiro achando que era a saída, porque ali havia uma luz verde - não se sabe que luz era essa.
Saída
Num dia de funcionamento normal da casa, a única saída é nos fundos da pista principal. Só uma pessoa passa pela porta. No caminho, ficava o caixa, aonde as pessoas pagavam as comandas para sair da boate. Depois de pagar, o cliente ainda tinha mais um degrau para subir, uma portinha para passar e grades. A porta tinha largura de 2 metros. “Para o fluxo que se espera, considerando que é a única saída, essa largura é pouca. Para a quantidade de pessoas que foi admitida na casa. A multidão faz um funil, que é condenado pela norma de emergência. A largura tem que permanecer a mesma ou alargar”, disse Moacyr. O engenheiro também explica que as grades deveriam ser retiradas. Ressalta que as portas poderiam ser trocadas por portas de correr, o que aumentaria consideravelmente a saída.

Entenda o caso
O incêndio na boate Kiss, em Santa Maria, região central do Rio Grande do Sul, deixou 237 mortos na madrugada do último domingo (27). O fogo teve início durante a apresentação da banda Gurizada Fandangueira, que fez uso de artefatos pirotécnicos no palco. De acordo com relatos de sobreviventes e testemunhas, e das informações divulgadas até o momento por investigadores:
- O vocalista segurou um artefato pirotécnico aceso.
- Era comum a utilização de fogos pelo grupo.
- A banda comprou um sinalizador proibido.
- O extintor de incêndio não funcionou.
- Havia mais público do que a capacidade.
- A boate tinha apenas um acesso para a rua.
- O alvará fornecido pelos Bombeiros estava vencido.
- Mais de 180 corpos foram retirados dos banheiros.
- 90% das vítimas fatais tiveram asfixia mecânica.
Equipamentos de gravação estavam no conserto.

Fonte G1

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